Nos últimos 4 anos, foram registrados números recordes de participantes em pesquisas clínicas, com 1,8 milhão apenas em 2022, segundo levantamento da IQVIA (2023). Principalmente após a pandemia de COVID-19, quando o mundo buscava por imunização contra o coronavírus, as vantagens que esses estudos podem proporcionar se tornaram mais evidentes. Aos pacientes, permitem o acesso a um melhor acompanhamento médico e a tratamentos inovadores que ainda não estão disponíveis no mercado. No entanto, eles não são os únicos beneficiados.
Os benefícios da pesquisa clínica não se limitam exclusivamente aos resultados que os estudos e suas consequentes inovações trazem à população. Criam-se inúmeras oportunidades de ganhos em termos de infraestrutura do sistema de saúde, processos de tratamento, recursos humanos, capital intelectual e atividade econômica, tanto para o centro que faz o estudo quanto para o país.
A maioria dos estudos que chegam ao Brasil já está na fase 3 de desenvolvimento, quando o objetivo é verificar a superioridade ao tratamento de referência e acompanhar possíveis eventos adversos. A partir disso, oferece acesso não só ao medicamento que está em teste, mas, em muitos casos, ao padrão-ouro para tratar a doença estudada, como explica a Dra. Carmela Nicolini, biomédica, gerente executiva da Oncologia Hospital Care e cofundadora da NC Pesquisa Clínica.
A viabilização desses tratamentos ocorre de forma igualitária, independente do paciente estar no sistema público ou no suplementar. As pesquisas clínicas também podem representar um “desafogo” para os serviços de saúde do país em meio aos altos custos, especialmente para áreas de alta complexidade, como destaca Gabriela Alerico, biomédica, gerente do Centro Gaúcho Integrado em Pesquisa Clínica e cofundadora da NC Pesquisa Clínica.
Em relação a hospitais e clínicas, investir em um centro de pesquisa significa aprimorar a imagem e a credibilidade da instituição, além de aumentar a capacitação dos profissionais, uma vez que as equipes de estudos estão em frequente atualização e treinamento.
A organização ainda se torna uma referência na jornada de uma determinada doença, tanto em relação aos tratamentos quanto ao diagnóstico, assistência e acompanhamento. Em certa medida, a jornada do paciente pode ser comparada ao padrão existente em grandes centros mundiais, visto que os dados coletados devem ser reprodutíveis em todas as corporações que conduzem o estudo.
Porém, para alcançar essas oportunidades com maior frequência e de forma mais efetiva, é preciso enfrentar alguns desafios.
Os obstáculos da pesquisa clínica no Brasil
Uma das barreiras mais significativas para os centros privados de pesquisas clínicas é o recrutamento. Ele está relacionado com o volume de pacientes, o perfil de remuneração médica e a competição com a atividade-fim da organização. Há ainda outras dificuldades a serem superadas, como os longos prazos para a aprovação regulatória, a heterogeneidade nas análises entre os comitês de ética e a morosidade no processo de importação dos insumos.
A baixa capacidade produtiva e de inovação na área, além da existência de poucos centros com infraestrutura adequada e equipe treinada, são dificuldades adicionais para o avanço dos estudos no Brasil. Ainda existe uma necessidade de melhoria da Plataforma Brasil, por onde os projetos são submetidos, o que também permite à sociedade acessar as pesquisas aprovadas. Porém, os principais obstáculos dos ensaios clínicos estão relacionados à burocracia, o que torna o país menos competitivo em relação ao prazo para desenvolvimento.
Para uma melhoria do cenário de ensaios clínicos em centros privados no país, faz-se necessário o investimento em infraestrutura e recursos humanos. Até que a instituição tenha volume de estudos e participantes para manter a operação, é preciso suporte financeiro. As parcerias com organizações públicas também favorecem o recrutamento nos estudos.
Além disso, é necessário investir em conscientização sobre os processos e as regras dos ensaios clínicos para desmistificar a ideia de que o paciente se torna uma cobaia.
É preciso deixar claro ao público que o participante da pesquisa tem assegurado todos os seus direitos, que são apresentados no Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). Os riscos descritos durante o estudo são comunicados ao paciente, que pode retirar seu consentimento a qualquer momento. O pesquisador também tem o poder de interromper a participação nos estudos, se julgar que os riscos são maiores que os benefícios.
A diversidade como vantagem para o Brasil
Um levantamento realizado pela IQVIA (2023) aponta que a representação de pacientes negros/afro-americanos e hispânicos em ensaios clínicos nos Estados Unidos diminuiu nos últimos anos. Atualmente, ela permanece abaixo dos níveis demográficos em diversas áreas terapêuticas, sobretudo na oncologia. Diante desse quadro, a miscigenação é um dos pontos fortes do Brasil no quesito de atração de pesquisas clínicas.
A inclusão de participantes com diversidade étnica e das minorias é, na atualidade, extremamente discutida na área. Na visão da chefe da Divisão de Pesquisa Clínica e Desenvolvimento Tecnológico do INCA – Instituto Nacional de Câncer, Dra. Andreia Melo, esse fator se torna essencial para avaliar a eficácia em diferentes cenários e populações e para as futuras incorporações pelas inúmeras agências regulatórias, caso o estudo se mostre positivo.
Como uma organização pode se tornar um centro para ensaios clínicos
Para as instituições que já conduzem protocolos clínicos, é importante que estejam atentas às mudanças do mercado, à entrega de qualidade e ao recrutamento eficaz. Já para aquelas que ainda não possuem centros de pesquisa clínica e desejam incorporá-los, o principal desafio é o conhecimento do processo e o tempo de desenvolvimento.
O planejamento de uma instituição para se tornar um centro de pesquisa clínica costuma ser bastante rigoroso e complexo. É necessário começar pelo básico: ter um Comitê de Ética, investigadores interessados e qualificados para conduzir os estudos, uma equipe experiente e infraestrutura mínima, além de conhecer o perfil dos pacientes. Manter um processo de melhoria contínua também deve ser pauta da gestão das organizações.
Outro ponto principal é investir em treinamentos com diferentes finalidades, que vão desde o conhecimento sobre protocolos e questões regulatórias até os métodos de recrutamento e estudos. Adaptar ou construir um espaço de acordo com a legislação vigente também faz parte da preparação.
O networking com pesquisadores e organizações de ensaios clínicos é ponto de partida para que um centro iniciante se torne conhecido e receba propostas de estudos das mais diversas fontes. As redes sociais podem ser uma aliada para esse objetivo, uma vez que facilitam as conexões e interações com profissionais influentes da área, independente da sua nacionalidade ou localização.
Até aqui, você já deve ter percebido que o investimento em pesquisas clínicas é uma estratégia para aumentar o acesso do paciente a tratamentos inovadores. Porém, também é uma maneira de otimizar os resultados de uma instituição de saúde privada, além de alavancar a inovação e a produção científica no país.
Dito isso, queremos saber a sua visão sobre o assunto: quais melhorias poderiam ser feitas para impulsionar a área de ensaios clínicos no país? Deixe a sua resposta nos comentários!
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O time de comunicação da Pharma e-Connection agradece às profissionais entrevistadas para a produção deste material:
- Dra. Andreia Melo, chefe da Divisão de Pesquisa Clínica e Desenvolvimento Tecnológico do Instituto Nacional de Câncer (INCA) e oncologista do Grupo Oncoclínicas;
- Dra. Carmela Nicolini, biomédica, gerente executiva da Oncologia Hospital Care e cofundadora da NC Pesquisa Clínica;
- Gabriela Cavol Aleric, biomédica, gerente do Centro Gaúcho Integrado em Pesquisa Clínica e cofundadora da NC Pesquisa Clínica.